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Consumidor que Pretende Comprar um Veiculo Conheça os Seus Direitos

COMPRA DE VEÍCULO USADO O consumidor que pretende adquirir um veículo usado deve tomar alguns cuidados para evitar problemas. A primeira providência é conhecer o produto que se vai adquirir, buscando informações técnicas suficientes para uma avaliação consciente. É preciso estar atento para a escolha da marca e tipo de veículo e do combustível que melhor atende às necessidades.  O próximo passo é buscar no mercado o produto que esteja dentro das expectativas e do orçamento.

As ofertas no mercado são muitas, por isso a escolha se torna difícil. O mais prudente é pedir auxílio a um profissional qualificado para se fazer uma avaliação do veículo antes de efetuar o negócio. O estado do motor e da lataria do carro são itens que merecem atenção. É direito do consumidor testar o veículo e submetê-lo a análise de um profissional que poderá  detectar possíveis defeitos ocultos. Antes de adquirir o veículo, é importante verificar a documentação, inclusive pesquisando junto ao Departamento Estadual de Trânsito (Detran) se existe alguma pendência, como por exemplo alienação, multas, etc.

- Verificar junto à Justiça comum e à Justiça do Trabalho se existe algum tipo de processo que envolva o veículo em questão.

Direitos garantidos pelo Código de Defesa do Consumidor

Mesmo nos contratos particulares - compra de pessoas física - o veículo está sujeito a garantia legal de 90 (noventa) dias, ainda que não exista documento por escrito, sendo vedado ao fornecedor fugir da responsabilidade oferecida pela garantia. (Art. 24 do Código de Defesa do Consumidor). O prazo para reclamar de defeitos aparentes é de 90 (noventa) dias a contar do recebimento do veículo, e para os vícios ocultos, o prazo inicia-se na data da constatação do vício. Veículo usado é vendido no estado em que se encontra, por isso a vistoria de um profissional qualificado é fundamental, mas isso não quer dizer que os defeitos ocultos, aqueles que não são de fácil constatação, estejam fora da garantia legal. O Código de Defesa do Consumidor, no art. 18, responsabiliza o fornecedor pelo vício de qualidade que torne o produto inadequado ou que lhe diminua o valor. Caso o vício não seja sanado no prazo máximo de 30 dias, o consumidor pode exigir alternativamente e a sua escolha: - A substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso. - A restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos. - O abatimento proporcional no preço. - Todos os contratos devem ser feitos por escrito, com identificação das partes e do produto, além do preço e condições de pagamento. - A Associação de Revendedores de Veículos (Assovemg) oferece aos seus filiados um certificado de vistoria do veículo, onde são discriminados os diversos itens do veículo para tornar a negociação mais segura e transparente. - Caso seja sua opção adquirir seu veículo usado em uma agência, exija na assinatura do contrato a entrega do certificado

 

CONHECENDO O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR  - Para facilitar a compreensão do Código é preciso conhecer o seu método e ter a exata visão do seu campo de aplicação, para que se evitem radicalismos. É um conjunto de normas imperativas, de ordem pública e interesse social (art. 1º) e portanto inderrogáveis pela via negocial, e de aplicação irrenunciável, visando a reequilibrar as relações de consumo, sempre no pressuposto da vulnerabilidade do consumidor. Assim, o consumidor não pode renunciar ou transigir direitos que lhe são próprios. Isso impede a concretização de qualquer hipótese em que o fornecedor pudesse oferecer vantagens ao consumidor em troca da renúncia deste a determinadas imposições legais (ex.: a garantia legal dos produtos e serviços, que é obrigatória, irrenunciável e inderrogável).

O CDC possui uma parte geral, de declaração, e uma parte especial, que desdobra a geral. Como base, assegura direitos ao consumidor e impõe deveres ao fornecedor. Assim, é uma declaração de direitos do consumidor, sujeitando o fornecedor a um dever jurídico de conduta onde se insere a obrigação de responder pelo descumprimento desse dever, independentemente de culpa. Ao imputar ao fornecedor obrigações quanto à forma de agir, o Código visualiza o efeito social dessa conduta e não leva em conta aspectos subjetivos. O que importa é a obrigação de responder pelo não cumprimento da imposição legal. Por exemplo, quando o agente econômico põe à venda um produto defeituoso, a Lei cobra a sua obrigação de oferecer somente produtos adequados e de acordo com o que se propague acerca deles, decorrendo daí o dever jurídico do fornecedor de prestar informações precisas e claras acerca do que expõe à venda.

1) A RELAÇÃO DE CONSUMO - Trata-se de uma relação jurídica marcada pela qualidade de uma das partes, o consumidor.

Enquanto a relação contratual comum pressupõe a existência de iguais, a relação de consumo é desigual, porque põe a nu o maior poder contratual do fornecedor. Caracteriza-se a relação de consumo pela presunção legal da superioridade do fornecedor, mesmo que seja o consumidor uma pessoa de boas posses financeiras, mas que, em princípio, desconhece, ou pouco conhece, a maioria das peculiaridades dos produtos e serviços que intenta adquirir. É isso que separa o Código, da anterior legislação contratual (Civil e Comercial), onde prevalecia, soberanamente, a autonomia da vontade, desde que atendido um mínimo de pressupostos legais. O direito do consumidor, composto de normas de ordem pública e interesse social, é intervencionista, de modo que, identificada a relação de consumo, o Código Civil, o Comercial e o Processual Civil, têm aplicação apenas subsidiária.

É certo que se continua a dar importância à autonomia da vontade e que o contrato ainda é considerado como lei entre as partes, porém sob a mais severa e imperativa orientação da vontade legal – expressão da vontade social – que impõe princípios objetivos, deveres de conduta, presunções e múltiplos condicionamentos cujo descumprimento implica em nulidade.

2) PRINCÍPIO DA BOA FÉ - O desenvolvimento da tutela do consumidor resulta da noção de boa fé. Mas não uma boa fé subjetiva, e sim entendida como imperativo de conduta, ou seja, objetiva. Por exemplo, na fase pré-contratual, o fornecedor deve informar, previamente, com absoluta correção, as características, a qualidade, a funcionalidade, a composição, o preço e a forma de pagamento do produto ou do serviço, sob pena de cometer a infração de publicidade enganosa. Essas informações integram a oferta, pelo que, embora antecedentes ao fechamento de qualquer transação negocial ou contratação, tornam-se desde logo em obrigações para o fornecedor.

3) PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA E DA INFORMAÇÃO - O princípio da transparência significa uma situação informativa favorável à apreensão racional dos sentimentos, impulsos, interesses, fatores, conveniências e injunções que surgem, interferem ou condicionam o comportamento de consumidores e de fornecedores. Pelo princípio da transparência, o fornecedor é devedor de informação, cumprindo-lhe esclarecer, avisar e predispor o consumidor a escolhas refletidas e autodeterminadas.

A informação há de ser correta, ampla e ostensiva. Ela é transmitida através da publicidade, prospectos, bulas, instruções de uso, rótulos e outros meios. Deve ser correta, adequada e veiculada de forma a que o consumidor a identifique como tal, e apreenda pelo menos o essencial sobre o que deseja adquirir.

Trata-se, a publicidade, de um instrumento de grande poder de influência no convencimento das pessoas. É decorrente da chamada sociedade de massas, e se deve à necessidade de as pessoas se valerem de um processo eficiente para descrever o que têm a oferecer a um grande número de outras pessoas ao mesmo tempo. A publicidade também decorre do excedente de bens, especialmente os de luxo, ou os que, de uma forma ou de outra, sejam desnecessários ou pouco necessários à sobrevivência. Produtos ou serviços fundamentais, entretanto, sempre se venderão por si mesmos. Como exemplo, não é necessário fazer publicidade de gêneros como o arroz, feijão, verduras e frutas, ou serviços como os transportes urbanos. Quando muito, aparecem mensagens de apelo referentes a marcas ("Arroz X", "Feijão Y", "Transportadora Z", etc). Portanto, é sobre os produtos e serviços, em princípio, dispensáveis, que se desenvolve a publicidade, com o intuito de despertar hábitos, disseminar condutas, criar expectativas, no sentido de vendê-los. A publicidade, então, é centrada na fase do convencimento e da decisão das pessoas ou grupos, utilizando argumentos capazes de modificar o seu pensamento e as suas atitudes, ao ponto de lhes diminuir a autocrítica e de lhes incrementar a sugestionabilidade. Pessoas jovens, por exemplo, às quais se dirigem apelos para a manutenção de boas formas físicas, entrando a seguir, a mensagem referente ao produto pretensamente capaz de alcançar esse fim. Tais práticas publicitárias, no afã de convencer, envolvem grande agressividade. Por utilizarem técnicas que sensibilizam o livre arbítrio, envolvem risco especialmente perigoso, o que não poderia ser descurado pela Lei.

Assim, o dever de informar corretamente está presente nos Art. 6º - III, 8º, 9º, 30 e 31, não importando a alegação de que "não houve intenção prejudicial", ou que se trata de "engano" ou mero "lapso", ou "erro de imprensa", pois a Lei não leva em conta os aspectos subjetivos. A infração a esses dispositivos pode caracterizar enganosidade ou abusividade (art. 37 e §§).

A publicidade enganosa é a que contém dados falsos, sendo capaz de influir o consumidor em erro a respeito da natureza, característica, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. Não é necessário que o consumidor tenha sido, efetivamente, enganado ou lesado. Basta que a publicidade possa induzir o consumidor em erro. Para caracterizá-la, não é exigível a ocorrência de prejuízo concreto. A simples utilização de publicidade enganosa presume o prejuízo difuso. O erro real, consumado, é um mero exaurimento.

A publicidade abusiva é a que incita à violência, ou quando é discriminatória de qualquer natureza, ou quando explora o medo e a superstição, ou se aproveita da deficiência de julgamento das crianças, ou desrespeite valores ambientais, e quando seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

Uma só publicidade pode ser ao mesmo tempo enganosa e abusiva. Como exemplo, um anúncio veiculado há alguns anos atrás em que várias crianças, muito bem treinadas e com equipamentos de segurança, faziam acrobacias em bicicletas de certa marca, como se fosse impossível fazer as mesmas acrobacias em outra. Uma criança, ao ver o anúncio, e por força da sua natural deficiência de julgamento em função da pouca idade, tenta praticar as acrobacias em sua própria bicicleta, sem treinamento ou equipamento, e fica exposta a perigos à saúde e à segurança, o que caracteriza a abusividade. Além disso, as acrobacias não são praticáveis sem treino prévio, mas podem ser feitas em qualquer bicicleta e não só naquela cuja marca se anuncia, o que caracteriza a enganosidade. Outro exemplo foi o de um anúncio de marca de roupa em que se mostravam duas crianças. Uma loura, com aparência de anjo, e outra, negra, com o cabelo arranjado na forma de dois pequenos chifres, dando-lhe a aparência de "diabo". A publicidade, nesse caso, é discriminatória de raça, pois mostra a criança negra associada a uma imagem maléfica. Por isso, é abusiva. E associa a "loura", necessariamente, ao bem, e a negra, necessariamente, ao mal, o que é enganoso e também abusivo.

Pode-se ainda mencionar os casos de anúncios que alardeiam propriedades "miraculosas" de bebidas (Ex.: "O conhaque do milagre", que associava certa marca de bebida à potência sexual masculina), ou de vitaminas e certos remédios para emagrecer.

Além de definir a publicidade enganosa e abusiva como crime, o Código concede ao consumidor (individual ou coletivo) a possibilidade de pleitear indenização por danos materiais e morais, a imposição de multa e a suspensão da publicidade acrescida de pena de execução específica, ou, simplesmente, o direito de aquisição do produto ou serviço na forma como anunciado, se o consumidor entender que isso lhe é benéfico (Ex.: anúncio de produto em "x" prestações sem juros nem correção, mas que, por lapso, não foi dito que haveria os acréscimos respectivos; nesse caso, o consumidor pode exigir a venda nas condições anunciadas).

4) O PRAZO DE REFLEXÃO - No art. 49, o Código dá relevância especial aos motivos que induzem o consumidor a adquirir produtos e serviços. Emoções, sentimentos, impulsos, que o levam a ceder aos apelos publicitários do fornecedor, até mesmo fora do estabelecimento comercial, como pela utilização do telefone, vendas a domicílio, ou por catálogo, ou via anúncios de televisão. Nesses casos, o consumidor apenas vê a imagem do produto ou de exemplos das conseqüências benéficas de um serviço (Ex.: tratamento para emagrecer, com imagens "antes" e "depois"). Mas não tem a oportunidade de exame in loco, nem da comparação com similares, e é levado a comprar pelo poder de convencimento empregado nessas técnicas de venda mais incisivas. Daí que o Código prevê um prazo de reflexão de sete dias, pelo qual o consumidor pode se arrepender da compra e cancelá-la, devolvendo o que recebeu. De modo que, nas publicidades onde esse prazo for anunciado, não se trata de favor da iniciativa do fornecedor, mas, simplesmente, do cumprimento da obrigação legal.

5) GARANTIA PARA O CUMPRIMENTO DA OFERTA - O art. 35 estabelece que, se o fornecedor se recusar a cumprir a oferta como foi anunciada, o consumidor poderá exigir o cumprimento forçado da obrigação (como nos exemplos acima mencionados), ou poderá aceitar outro produto ou serviço equivalente, ou rescindir o contrato, sendo-lhe restituído o que pagou por antecipação, com juros e correção monetária.

O art. 46 estabelece que os consumidores só estarão obrigados pelos contratos se lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio do seu conteúdo e da compreensão do seu sentido e alcance.

Essa "tomada de conhecimento" não pode ser entendida como simples leitura e nem como aceitação ou consentimento, como ocorre freqüentemente nos contratos de adesão, em que o adquirente é levado a assinar uma declaração de que conhece, compreende e aceita todas as condições que lhe foram apresentadas. Isto porque não há declaração de conhecer. A cognoscibilidade advém do entendimento, da compreensão do alcance e do sentido do que está proposto pelo fornecedor, principalmente quanto aos aspectos desvantajosos para o consumidor. A própria redação do contrato deve ser em linguagem acessível, sem formulações de conceitos abstratos, e em seqüência, de modo a que não se fracione uma determinada desvantagem em uma cláusula e o restante em outras, distantes umas das outras, no texto contratual. Essas cláusulas que, de algum modo, onerem o consumidor ou limitem seus direitos, devem ser impressas em destaque. Caso contrário podem ser consideradas como ineficazes (art. 54, §§ 3º e 4º).

6) A "NORMA OBJETIVO" DO ART. 4º -

O art. 4º prevê a instituição de uma Política Nacional de Relações de Consumo, partindo do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, e tendo em vista os direitos básicos enunciados no art. 6º, incisos I a X, e no art. 7º, que trata da aceitação interna, no Brasil, de tratados internacionais.

Está prevista a intervenção do Estado, seja através de lei ou entidades próprias de defesa do consumidor (ex.: os PROCONs), seja indiretamente, para incentivar a formação de associações de consumidores. O objetivo é o atendimento das necessidades dos consumidores, que abrangem não só os seus interesses econômicos como também a sua vida, segurança, saúde e dignidade. Essa é a regra de interpretação fundamental do Código, de modo que as decisões administrativas e judiciais devem se orientar, vinculadamente, pelos fins previstos nesses preceitos legais. O art. 4º condiciona a incidência e a aplicação das normas do Código aos princípios-objetivos afirmados no referido dispositivo e estabelece o balizamento para a interpretação de todas as demais regras, cuja interpretação será tanto mais correta quanto mais próxima desses princípios enumerados, quais sejam, a boa fé, a transparência, a informação completa e correta, o respeito à saúde, dignidade e segurança e a proteção ao patrimônio material e moral do consumidor para a melhoria das suas condições de vida. Por isso que esse art. 4º é denominado de "norma objetivo".

7) CLÁUSULAS E PRÁTICAS ABUSIVAS - A boa fé de que trata o Código não tem a conotação subjetiva do Direito Civil, portanto não leva em conta a questão da culpa quando se trata de identificar responsabilidades. A boa fé, no CDC, é tratada objetivamente, pressupõe lealdade, correção e honestidade como imperativos de conduta (art. 51 – IV, parte final). É boa fé de comportamento e vale, inclusive, na situação em que o fornecedor oferece, à venda, produtos defeituosos, nocivos ou perigosos, para que não seja passada, ao consumidor, uma falsa idéia do bem ou serviço que irá adquirir (ex.: se o fornecedor expõe à venda um produto que sabe defeituoso, deve avisar o consumidor, mesmo que haja redução de preço; se põe à venda um produto tóxico, isso há de ser informado com toda a clareza, bem como os meios de neutralizar os efeitos no caso de intoxicação; no caso de medicamentos, devem ser claramente informados os efeitos colaterais, a posologia adequada e os meios de cura para superdosagens).

O Código busca estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo. Equilíbrio esse que é intrinsecamente afetado em razão da desigualdade de poderes contratuais entre quem se organiza profissionalmente (o fornecedor) e quem deseja ou necessita realizar um ato isolado de compra ou uso de produto ou serviço (o consumidor), mas que não domina a plenitude de informações especializadas que a outra parte (o fornecedor) possui a respeito deles. O contato que se estabelece entre ambos já nasce desequilibrado, o que é tanto mais evidente nos contratos de adesão, mediante os quais uma das partes (o fornecedor) impõe à outra (o consumidor) as suas próprias condições negociais, restando ao aderente concordar e comprar o bem ou serviço, ou discordar, mesmo parcialmente, e desistir da compra. Não há negociação nem meios termos. Portanto, o Código impõe certas condições prévias para a realização dos contratos, no sentido de restringir vantagens excessivas ao fornecedor e demasiada onerosidade ao consumidor. Essas situações de vantagem e onerosidade exacerbadas, desfiguram o sentido de acordo que deve prevalecer nos contratos, rompem o equilíbrio e se caracterizam como abusivas.

São abusivas, as cláusulas iníquas, perversas, injustas, contrárias à eqüidade ("leoninas"), que desrespeitem valores éticos da sociedade, que sejam incompatíveis com a boa fé ou que coloquem o consumidor em desvantagem excessiva, como descritas no art. 51, incisos I a XVI.

Ressalve-se que o Código, ao mencionar hipóteses de abusividade, diz que são nulas de pleno direito, "entre outras", as que enumera. A enumeração, portanto, é exemplificativa, de modo que outras hipóteses além das especificadas na Lei, serão abusivas se ferirem os direitos básicos do consumidor fixados no art. 6º, os princípios objetivos previstos no balizamento geral estabelecido pelo art. 4º e seus respectivos incisos, ou o princípio geral constitucional da defesa do consumidor (art. 5º - XXXII da CF/88).

No entanto, a presença de uma cláusula abusiva num contrato pode não o anular na totalidade. A nulidade afetará apenas a cláusula específica, a não ser que, com a sua retirada, resulte ônus excessivo para qualquer das partes (nesse caso, o consumidor e o fornecedor). Trata-se do princípio da conservação dos contratos, previsto no § 2º do art. 51, que, num sentido mais amplo, beneficia o consumidor, porque previne situações de esperteza, pelas quais um mau fornecedor estabelecesse, propositadamente, cláusulas abusivas num contrato sabendo de antemão que iria ser futuramente anulado na totalidade. Em muitas situações, isso traria vantagem àquele fornecedor em prejuízo do consumidor, a exemplo de um contrato imobiliário de longa duração cujo desfazimento da transação implicaria na devolução do imóvel, cuja aquisição tinha sido o objetivo principal. Mesmo que fossem ressarcidas as prestações pagas, ainda assim o consumidor sofreria prejuízos de ordem pessoal e moral irreparáveis.

No intuito de preservar o contrato, mesmo diante de abusividade, o Código prevê que o Juiz, de ofício ou a requerimento do interessado, proceda à modificação de cláusulas que fixem prestações desproporcionais, ou a sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem em excessivamente onerosas (ex.: um desastre financeiro sofrido pelo consumidor, ou o acúmulo de correção monetária cujo valor venha a ser de tal modo oneroso que se torne em extremamente penoso para o contratante).

O art. 39 define práticas abusivas, nos incisos I a X, sujeitando os que as exercem, às sanções administrativas do art. 56, ou definindo algumas delas como crime e as respectivas penas nos arts. 63 a 79. Exemplos de práticas abusivas são: 1) a "venda casada", através da qual o fornecedor condiciona a venda de um produto, a outro (v.g., uma padaria que só venda leite a quem comprar, no mínimo, um quilo de pão); 2) a recusa de atendimento às demandas dos consumidores na medida da disponibilidade de estoque (ex.: sonegação de mercadoria em ocasiões de falta, como leite, combustíveis, etc, ou situações em que, diante da verificação de erro na publicidade, o fornecedor se recusa a vender o produto alegando que acabou o estoque, caso em que o consumidor pode exigir a verificação, inclusive das Notas Fiscais de venda, para conferir a veracidade ou não dessa afirmação); 3) enviar produto ou serviço ao consumidor sem a sua prévia solicitação, caso em que será considerado como amostra grátis, inexistindo a obrigação de pagamento, conforme o parágrafo único do mesmo art. 39; 4) prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor tendo em vista a sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe produtos ou serviços (ex.: fornecedor que induza uma pessoa rústica, ou um pródigo, a assumir um compromisso que, posteriormente, não poderá honrar; nesse caso, a transação pode ser desfeita, com a devolução do produto e da importância eventualmente paga, com juros e correção); 5) exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva, o que só poderá ser avaliado caso a caso; 6) executar serviços sem prévio orçamento, salvo se já exista entre o fornecedor e o consumidor, a repetição de prática semelhante, anteriormente, em função de mútua confiança); 7) repassar informação depreciativa referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos (ex.: fornecedor que espalha, de modo depreciativo, notícia de que o consumidor já o acionou na justiça para haver prejuízos decorrentes de defeitos em produtos por ele vendidos; nesse caso, o consumidor terá usado um direito seu, e não pode ser alvo de comentário desairoso por conta disso); 8) colocar no mercado, produto ou serviço em desacordo com as normas técnicas; 9) recusar a venda de bens ou serviços, diretamente a quem se disponha a comprá-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais (ex.: supermercado que limita a venda de cerveja a "x" unidades por pessoa, salvo em ocasião de racionamento ou se tal limitação for estabelecida em lei especial, como no caso de determinados produtos farmacêuticos ou químicos de venda controlada); e X) elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços (ex.: cobrança de ágio). Já no art. 42, o Código proíbe a cobrança constrangedora de dívidas (ex.: o fornecedor que "deixa recado" no local de trabalho do consumidor para avisá-lo da dívida e da ameaça de protesto ou execução, ou empregando termos grosseiros).

Igualmente às cláusulas contratuais, o Código também é exemplificativo quando se refere às práticas abusivas, porque, ao descrevê-las, usa a expressão "dentre outras". Isso significa que, afora as especificadas no art. 39 e 42, outras práticas poderão ser abusivas se contrariarem os mesmos objetivos e direitos já mencionados nos arts. 4º e 6º, ou que desrespeitarem o princípio geral da defesa do consumidor inscrito no art. 5º - XXXII, da Constituição Federal de 1988.

8) LIMITES DA TUTELA DO CÓDIGO - O art. 2º define o consumidor como toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, ou seja, para seu uso, fruição, posse, gasto, deleite e proveito próprio. O objeto da Lei é o de tutelar o consumidor final, sobre o qual incidem de forma mais intensa todos os efeitos sociais e econômicos inerentes à relação de consumo. Assim, o consumidor não é somente aquele que compra o produto ou o serviço, mas quem o usufrui, de modo que está abrangido quem recebe um presente ou doação, pois é esse o destinatário final.

O art. 17 equipara ao consumidor, todas as vítimas do evento danoso (ex.: uma explosão de um bujão de gás que atinja a família do consumidor, seus vizinhos ou amigos, que poderão invocar o Código no que tange à responsabilidade do fornecedor para efeito de se ressarcirem dos danos sofridos). O parágrafo único do art. 2º também equipara a consumidor, todas as pessoas determináveis ou não que hajam intervindo na relação de consumo, e o art. 29 equipara aos consumidores todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas previstas no Código. Estende-se, assim, a proteção à coletividade das pessoas, à sociedade como um todo, contra os danos potenciais ou efetivos resultantes de produtos ou serviços defeituosos e de cláusulas e práticas abusivas (ex.: a publicidade enganosa, que atinge o conjunto da sociedade, porque todos os seus integrantes são compradores em potencial do produto ou serviço anunciado).

Também as pessoas jurídicas, as empresas, são consumidoras dos produtos e serviços básicos e necessários à sua existência, como a água, a energia elétrica, a telefonia, o mobiliário, lâmpadas, aparelhos eletrônicos, materiais de escritório e tantos outros que, tal qual as pessoas físicas, tenham de usar, ou consumir, como destinatárias finais.

Excluem-se os produtos ou serviços destinados à transformação ou incorporação a outros para posterior industrialização ou revenda, porque nesse caso assumem a qualidade de insumos, e não estarão sendo consumidos, mas transformados ou revendidos. É o caso, por exemplo, de uma fábrica de móveis que compra madeira para fabricar mesas e cadeiras. A madeira, a cola, os pregos e parafusos usados na fabricação do produto final, são insumos, acerca dos quais esse fornecedor se responsabiliza solidariamente, no caso de futuro defeito. Do mesmo modo as mercadorias adquiridas por pessoas físicas ou empresas comerciais para revenda, no exercício da atividade profissional, que não são consumidas por elas, e sim ofertadas à população.

O art. 3º define o fornecedor como sendo toda a pessoa física ou jurídica, nacional ou estrangeira (incluindo as sociedades de fato ou irregulares, cujas pessoas físicas componentes são as responsáveis), que exerce as mais variadas atividades, de produção, criação, montagem, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Ao especificar, na definição de fornecedor, o exercício de atividade, o Código profissionalizou o conceito. Isso significa que, para a caracterização da qualidade de fornecedor, é necessário o exercício profissional habitual. Assim, se alguém, eventualmente, vender o seu automóvel a um terceiro e o veículo apresentar defeito, o comprador não poderá invocar, contra esse vendedor, as normas do Código do Consumidor, porque a relação de consumo não se perfez, devido à ausência de um fornecedor na forma prevista em Lei. Há um produto, há um consumidor, mas não há o fornecedor, pois o que vendeu o veículo não faz disso uma atividade habitual. Poderá, o comprador, valer-se das normas dos códigos Civil e Processual para se ressarcir de possíveis prejuízos perante aquele vendedor, mas não do Código do Consumidor. Entretanto, conserva a sua qualidade de consumidor em relação ao fabricante do veículo ou seu concessionário (representante).

O Código abrange, assim, a categoria dos fornecedores em geral. São fornecedores, todos os que, no exercício de uma atividade profissional, produzem bens ou prestam serviços e os que os colocam no mercado (os intermediários), quer sejam públicos ou privados, nacionais ou estrangeiros, regularmente constituídos ou não, sendo que todos respondem solidariamente pelos vícios e defeitos dos produtos e serviços com que lidam (art. 18). Isso significa que, diante de danos, o consumidor poderá acionar qualquer um deles e não apenas o lojista que vendeu o produto ou o prestador direto do serviço.

O § 1º do art. 3º define produto como qualquer bem, "móvel ou imóvel, material ou imaterial". Importa ressaltar que tenha conteúdo finalístico, de valor econômico, capaz de satisfazer necessidades e desejos humanos, suscetível de circulação do fornecedor para o consumidor, este como destinatário final. Se, por exemplo, um comerciante de produtos farmacêuticos dá a alguém uma fruta colhida em árvore do seu quintal, essa fruta não será um produto no conceito legal, e a relação que se formou entre os dois não foi uma relação de consumo, devido à ausência de conteúdo finalístico e de valoração econômica. Assim, se o agraciado tiver um prejuízo à sua saúde decorrente daquele gesto do comerciante, não poderá invocar contra ele o Código do Consumidor, pois também nesse caso não se perfez a relação específica de consumo. Poderá utilizar-se da Lei Civil e Processual, mas não da legislação consumerista.

O § 2º do mesmo art. 3º define o serviço como sendo uma prestação de atividade no mercado de consumo mediante remuneração, como as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, sejam elas oriundas de entidades públicas ou privadas, bem como de profissionais liberais, excluindo-se as de caráter trabalhista (c/c o art. 14 § 4º). Esta exclusão se deve ao fato de que, na relação empregatícia, o empregador é quem detém o poder de comando, arcando com os riscos mas auferindo os lucros da atividade econômica, não sendo justo que o empregado, que já está submetido à subordinação patronal, ainda tivesse de suportar os eventuais prejuízos da atividade cujos lucros não aufere.

Integra-se a relação de consumo, ao envolver duas partes bem definidas e perfeitamente ajustadas aos conceitos legais, em torno de um produto ou serviço economicamente valorável. De um lado, o consumidor (individual ou coletivo) como destinatário final, e de outro, o fornecedor de produtos ou serviços. Essa relação visa à satisfação de necessidades ou desejos do consumidor. Este, porém, não dispõe de controle sobre a produção e comercialização dos bens e serviços que lhe são ofertados e está sujeito ao poder e às condições dos ofertantes, pelo que se encontra em situação de hipossuficiência, ou vulnerabilidade, idêntica àquela que o detentor da força de trabalho (o empregado) experimenta em face do detentor dos meios de produção (o empregador). Há, assim, um manifesto desequilíbrio de poder nas relações que se formam entre o fornecedor e o consumidor, em favor do mais poderoso (o fornecedor, tal qual o empregador na relação trabalhista). Desequilíbrio que o Código trata de eliminar, mas que só é aplicável nesse tipo específico e qualificado de relação, onde se achem presentes os elementos que a integram: fornecedor, consumidor, produto ou serviço economicamente valorável.

9) VÍCIOS E DEFEITOS DOS PRODUTOS E SERVIÇOS - Os produtos e serviços são defeituosos quando não oferecem a segurança que deles se espera. É o produto imperfeito ou deficiente (art. 12 e seguintes), que pode causar danos à saúde e à segurança do consumidor, ou o serviço que, prestado sem segurança, causa danos, tanto pela má execução em si mesma considerada quanto pelos produtos utilizados no decorrer da prestação. Esses danos são definidos como "fatos do produto" e "fatos do serviço".

Os produtos e serviços são viciados quando apresentam imperfeições que acarretam a inservibilidade ou a diminuição do seu valor. Assim, os produtos e serviços podem ser impróprios ou inadequados ao consumo, ou ter o seu valor diminuído por conta de vícios de qualidade ou de quantidade, ou em decorrência da disparidade com as indicações que os acompanham, ou ainda quando não atendam às normas regulamentares.

Essa diferença entre vícios e fatos do produto ou do serviço acarreta diferenças no ressarcimento dos prejuízos. Diante de danos por fato do serviço ou do produto, o ressarcimento é amplo, enquanto que, diante de vícios, o ressarcimento se limitará às seguintes alternativas: 1) abatimento no preço, no caso de diminuição de valor, ou, 2) substituição das partes viciadas, no produto, ou refazimento de fases mal executadas do serviço, ou 3) restituição do valor pago ou a substituição do produto, ou o refazimento total do serviço, nos casos de inservibilidade.

Se os produtos e serviços se mostrarem perigosos ou nocivos após a introdução deles no mercado, o fornecedor deve comunicar o fato às autoridades assim que tiver tomado conhecimento da nocividade ou periculosidade, bem como anunciar o fato às suas expensas, aos consumidores.

Por exemplo, no episódio da comercialização de pílulas anticoncepcionais inócuas, caracterizou-se o dano às mulheres que engravidaram, em decorrência de um fato do produto, qual seja, a ausência do princípio químico impeditivo da gravidez, que, nesses casos, era notoriamente indesejada (caso não fosse, as mulheres não estariam consumindo o anticoncepcional). O ressarcimento dos prejuízos materiais e morais advindos da gravidez devem ser os mais amplos, para abranger as despesas obstétricas, o parto e o sustento da criança até à idade adulta, quando possa se auto prover, e, dependendo do caso específico, até mesmo o sustento da mãe. Se ocorrer a morte da mulher ou da criança, ou de ambos, em decorrência de fato que se conecte com a gravidez, os familiares também fazem jus a reparação financeira perante o fornecedor.

10) GARANTIA LEGAL E CONTRATUAL - Pelo art. 50, a garantia contratual é complementar à garantia legal. A garantia legal é obrigatória (arts. 24 e 25) e a especificação do direito de reclamá-la está nos arts. 26 e 27. Decorre do caráter de ordem pública e de interesse social, sendo imperativa, obrigatória, total, incondicional, inegociável. Já a garantia contratual não é obrigatória. O fornecedor pode concedê-la ou não, embora quase sempre o faça, por questões de marketing. Mas, ao conceder a garantia contratual, esta passa a integrar a oferta, e o fornecedor se vincula a ela, obrigando-se a honrá-la.

Enquanto a garantia legal é total e incondicional, a garantia contratual pode ser parcial porque admite a exclusão de certos componentes (Ex.: as montadoras de veículos automotores costumam excluir alguns itens como baterias, câmaras de ar e pneus; esses itens, por sua vez, já vêm com a garantia dos respectivos fabricantes). De um modo geral, a garantia contratual também é condicionada às instruções de uso.

A contagem do prazo para reclamações em ambas, começa no mesmo dia, embora haja decisões judiciais no sentido de que a garantia legal só começa a contar ao final da garantia contratual.

11) DIREITO A SERVIÇOS PÚBLICOS ADEQUADOS, SEGUROS E CONTÍNUOS - No inciso X do art. 6º, o Código estabelece como direito básico do consumidor, a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos, e, no art. 22, acrescenta que tais serviços devem ser adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

A continuidade dos serviços essenciais advém de que se tratam de serviços de importância relevante, como o abastecimento de água, energia, esgotamento sanitário e a telefonia.

Continuidade significa prestação permanente, sem interrupções, salvo as decorrentes de caso fortuito ou calamidade.

As concessionárias desses serviços, quer sejam empresas de alguma forma ligadas ao setor público, ou se forem de capital privado, são fornecedoras, na definição legal. Estão sujeitas às regras do Código, respondendo pelos defeitos e vícios na prestação dos serviços igualmente a qualquer outro fornecedor.

No caso de interrupção por falta de pagamento do consumidor, a descontinuidade ocorre por sua desobediência às normas administrativas e técnicas da prestação, ficando sujeito à sanção que pode ser a suspensão do fornecimento (o "corte"). Entendemos que se trata de um privilégio odioso, que contradiz a própria essencialidade do serviço. A nenhum fornecedor é dado o direito de usar da própria força ("manu militari") para recuperar créditos, devendo recorrer à via judicial, ou por negociação direta. Entretanto, predominam decisões judiciais admitindo o corte do fornecimento por parte de concessionárias de serviços públicos como o abastecimento de água, de energia elétrica, gás encanado e telefonia, apesar de essenciais...

12) RESPONSABILIDADE CIVIL DO FORNECEDOR

INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - No regime do Código do Consumidor, a responsabilidade civil é objetiva, (arts. 12 e 14), ou seja, independente de qualquer questionamento quanto à eventual culpa do fornecedor pelos prejuízos advindos ao consumidor. O ofertante do produto ou do serviço é responsável pelos danos causados, não em função de culpa por tal causação, mas pelo simples fato de que colocou o produto ou serviço no mercado de consumo. Assim, o prejudicado não precisará mais de provar a existência de culpa do fornecedor, como sucedia antes do Código, porque a objetivação da responsabilidade dispensa a análise subjetiva da culpa ou do dolo, e considera o evento danoso como suficiente para constituir a obrigação de indenizar.

No entanto, às vezes há dificuldades para a comprovação do defeito que causou o dano. Nesses casos, a Lei prevê a possibilidade da inversão do ônus da prova em favor do consumidor, de modo que não mais lhe caberá provar a existência do defeito. O fornecedor é que terá de provar que o produto estava perfeito, ou que o defeito decorreu do uso inadequado do produto por parte do consumidor. Vale lembrar que o consumidor poderá acionar qualquer um dos envolvidos na cadeia de consumo, ou seja, o lojista, ou o fabricante, ou o representante, etc.

Quanto à responsabilidade pelo fato do serviço, o respectivo prestador é obrigado a reparar os danos causados por defeitos relativos à prestação. Responde também quando não prestar as informações sobre os riscos do serviço. Diante de vícios do serviço, o consumidor tem as alternativas previstas nos incisos I, II e III do art. 20: reexecução dos serviços sem custo adicional, ou a restituição da quantia paga com atualização e sem prejuízo de eventuais perdas e danos, ou o abatimento proporcional do preço.

A responsabilidade objetiva, porém, não significa responsabilidade absoluta, pois há a possibilidade da prova liberatória por parte do fornecedor nas seguintes hipóteses: 1) quando não tiver sido aquele fornecedor que colocou o produto no mercado; 2) quando, efetivamente, ficar provado que inexiste o defeito, e 3) quando ficar provado que o defeito foi causado por mau uso do consumidor. Também se exime o fornecedor quando ficar demonstrado que o defeito era de somenos importância, tal como uma embalagem com um pequeno rasgão.

Quanto à responsabilidade dos profissionais liberais (médicos, por exemplo), o Código abre exceção e admite a verificação de culpa (ex.: em caso de erro médico, que se caracteriza através da negligência, imprudência, imperícia do profissional).

13) DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - Por força da independência da pessoa jurídica em relação às pessoas físicas ou outras pessoas jurídicas que a compõem (o quadro societário), pode ocorrer que o consumidor não atinja o verdadeiro responsável pelo ressarcimento a que tenha direito.

O CDC, ao art. 28, adotou a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, originária do direito norte-americano ("Disregard of Legal Entity"), mediante a qual pode-se penetrar na estrutura constitutiva da pessoa jurídica para alcançar quem a compõe, inclusive em seu patrimônio particular, diante da prática de fraude, abuso de direito ou desvio das finalidades da empresa.

A pessoa jurídica é uma ficção do Direito que serve para proteger o patrimônio particular de quem a compõe, em face de insucessos que possam atingir a empresa decorrentes do risco inerente à atividade comercial ou industrial. Seria injusto que pessoas empreendedoras ficassem com seu patrimônio à mercê desses riscos, daí que o Direito adotou a ficção da personalidade jurídica, cujo patrimônio não se confunde com o das pessoas que a compõem em sociedade, no intuito de protegê-las. Mas, tal proteção pressupõe o exercício correto e leal de atividades, conforme a lei e as práticas empresariais consideradas normais. No entanto, qualquer ficção torna-se em insustentável se se faz uso dela para estendê-la a casos aos quais não se deva submeter, conforme já assinalava o Jurista alemão KANTOROWICZ, desde o início do Séc. XX. A prática de fraude, abuso de direito, desvio das finalidades da sociedade, desvirtuam a proteção pretendida e anulam a ficção legal da independ6encia da pessoa jurídica em relação aos sócios. Por isso, o CDC concede ao juiz o poder de desconsiderar a ficção legal da personalidade jurídica para alcançar o patrimônio dos sócios sempre que aquela independência da pessoa jurídica se torne em empecilho para o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelos consumidores, conforme o § 5º do art. 28.

A Lei acolhe, como não poderia deixar de ser, a constatação de que a personalidade jurídica não pode se isolar ou se dissociar completamente da personalidade dos que a compõem. O princípio jurídico de que a pessoa jurídica não se confunde com os sócios que a compõem, não pode impedir a realização da justiça nem a aplicação da lei. A pessoa jurídica, como ficção, é um ser acidental que resulta das relações que ocorrem entre as pessoas que a constituem. Principalmente quando a pessoa jurídica tem, na sua composição, um ou alguns sócios com participação de tal modo majoritária no capital que podem dispor de poderes exacerbados no patrimônio e na administração da empresa, a qual se transforma, assim, numa pseudo-sociedade, confundindo-se, na prática, com aqueles. Nesses casos, pode acontecer que o objetivo fixado nos atos constitutivos da empresa, ceda lugar aos objetivos pessoais desses integrantes, pelo que passa a haver uma identidade entre estes e a pessoa jurídica, a qual se torna em mera projeção deles.

O mesmo pode ocorrer quando a pessoa jurídica tem, como sócios, outras pessoas jurídicas. Nessa situação, a empresa pode ser mera capa (ou "laranja") para outras sociedades e sócios sem condições de suportar os efeitos da atuação judicial, ou para se furtarem a ela. Então, toda vez que o juiz se vir na situação em que, se prestigiasse a independência da pessoa jurídica, iria acobertar a impunidade de quem a compõe, deve ignorar a pessoa jurídica e sentenciar como se ela não existisse, afastando a separação patrimonial que há entre ela e os sócios, para imputar, a estes, os atos daquela, e responsabilizá-los.

14) PRAZOS DE RECLAMAÇÃO - O prazo para reclamar sobre defeitos, que pelo Código Civil é de quinze dias (art. 176-C.C.), foi ampliado pelo Código do Consumidor para trinta dias quando se tratar de bens não duráveis e de noventa dias para os bens duráveis, contados a partir do momento em que o consumidor recebe o bem ou o serviço concluído. Há, também, o prazo prescricional de cinco anos para que o consumidor ingresse com ação visando à reparação de danos pelo fato do produto ou do serviço, contados, aqui, a partir do momento em que tomar conhecimento do defeito.

15) BANCOS DE DADOS E CADASTROS - Os bancos de dados ou cadastros, são um instrumento poderoso para o desenvolvimento salutar das relações de consumo, por isso exige-se que contenham informações corretas. As informações errôneas prejudicam os negócios, pois será com base nelas que os fornecedores irão decidir pela negativa de conceder crédito a alguém, do que decorre o travamento de uma transação comercial por equívoco inadmissível. Isso afeta negativamente o mercado de consumo e prejudica a harmonia que deve existir entre os participantes da relação de consumo, conforme previsto no art. 4º.

Banco de dados é toda reunião de dados pessoais ou de consumo, gerais ou específicos, sobre débitos, feita por pessoa física ou jurídica, privada ou pública, sob a forma de fichas, registros, arquivos ou cadastros, por processo manual, mecânico ou eletrônico, para uso próprio ou fornecimento a terceiros.

Constituem-se, os bancos de dados, em instrumentos da maior relevância para os interesses dos consumidores e fornecedores, daí que o Código os considera como de caráter público (art. 43, § 4º). Isto significa que é permitida a impetração do habeas data previsto na Constituição, no caso de negativa de fornecimento, ao consumidor, das informações sobre ele constantes nesses cadastros.

Pelo § 1º do art. 43, os bancos de dados e cadastros não podem conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos, pois é esse o prazo em que prescreve a ação cambiária. No entanto, há débitos cuja cobrança pode ser efetuada em prazo superior. A maioria entende que, nesse caso, fica o fornecedor prejudicado, porque os dados só podem ficar armazenados por cinco anos. Ocorre, porém, que o § 5º diz que não serão fornecidas quaisquer informações negativas dos consumidores uma vez "consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos". Esta última frase admite, a meu ver, prazo superior para a armazenagem desses dados, vez que relacionado com a respectiva ação de cobrança, cujo prazo e maior do que os cinco anos aludidos no § 1º.

16) SANÇÕES ADMINISTRATIVAS - A infração às normas imperativas do Código pode implicar na aplicação das sanções administrativas previstas no art. 56, que, conforme a gravidade, variam da multa à apreensão do produto ou suspensão do fornecimento do produto ou do serviço, à cassação do registro, à revogação da concessão ou cassação de licença, à suspensão da atividade ou interdição do estabelecimento comercial ou industrial infrator, obra ou atividade, à intervenção administrativa e à imposição de contrapropaganda.

Cabe aos órgãos oficiais, da União, Estados e Municípios, tais como os PROCONs, SEDECONs, Vigilâncias Sanitárias, INMETRO, SUSEP, CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), Delegacias de Polícia do Consumidor, e outros, aplicá-las

As sanções podem ser aplicadas cumulativamente, conforme o parágrafo único do art. 56, sem prejuízo de outras de natureza civil e penal, bem como ainda outras reguladas em outras Leis que regem o exercício da atividade econômica respectiva (Lei 4137/62, Lei Delegada 04/62, Lei 7784/89, Lei 8002/90 e Lei 8158/91). Há quem entenda que tal cumulatividade é impossível por que se trataria de repetição da punição ("bis in idem"). Mas, como o art. 56 do CDC é taxativo, a questão da cumulatividade se resolve por força da independência das legislações.

17) CRIMES DE CONSUMO - Os crimes de consumo são os que afetam as relações de consumo. Sua inclusão no CDC deveu-se à necessidade de especialização, através da tipificação penal, de práticas consideradas como graves e relacionadas com a defesa do consumidor, cuja punição seria insuficiente através apenas de sanções administrativas.

Os crimes de consumo têm como objetivo jurídico principal as relações de consumo. São crimes de lesão, pois ferem um bem jurídico coletivo ou difuso que se vê afrontado com a conduta do agente, e não apenas submetido a perigo de dano. De modo que, para a configuração dos tipos penais, basta a comprovação da conduta objetiva do agente, não sendo necessária a demonstração de que tal conduta tenha causado perigo ou dano concreto a um interesse jurídico individual.

O objetivo material dos crimes de consumo é o produto ou o serviço.

Em matéria penal, o CDC não admite a inversão do ônus da prova e nem a objetivação da responsabilidade, a qual depende sempre da caracterização da culpa ou do dolo, pois nesta parte, se trata de matéria penal, que se relacionam com o bem da liberdade. Então, a conduta (ação ou omissão) e a consciência dessa conduta hão de ser suficientemente comprovadas. Na dúvida, não há incriminação. Nesta parte, o CDC não inova, e nem poderia fazê-lo. Complementa o Código Penal, ao prever incriminações de condutas não tipificadas naquele.

Os crimes de consumo se relacionam, quase todos, com a questão da informação correta, como ocorre nos arts. 63 e § 1º, 64, 66, 67, 68, 71, 72 e 73. Os tipos previstos nos arts. 66 a 69, dão efetividade aos arts. 36 e 37 e guardam relação com a publicidade enganosa. O art. 70 pune o prestador de serviços que empregar peças usadas no conserto, recondicionamento ou retificação de produtos sem autorização do consumidor. Trata-se de punir, por exemplo, o mecânico que conserta o motor de um carro usando peças usadas em lugar das novas sem que o consumidor saiba disso. E o art. 71 se relaciona com a conduta prevista no art. 42 (cobrança de dívidas com ameaça ou constrangimento). Neste particular, devem ser observados os arts. 146 e 147 do Código Penal que tratam do constrangimento e ameaça. Entretanto, o conceito de ameaça no Código do Consumidor, vai mais além do que o do Código Penal porque, para efeito das relações de consumo, não se exige que a ameaça chegue a assustar o consumidor. A simples ameaça patrimonial ou moral em si mesma considerada, já se enquadra no tipo descrito no Código do Consumidor. Os tipos dos arts. 73 e 74 punem quem impedir ou dificultar o acesso ou deixar de corrigir informações do consumidor em bancos de dados ou fichas e registros. O art. 75 diz respeito à co-autoria, o art. 76 trata das circunstâncias agravantes e o art. 77 fixa o valor das penas pecuniárias.

Os crimes de consumo são afiançáveis, conforme o art. 79. Admitem o concurso material e formal com outros crimes, conforme o art. 61, e não são absorvíveis por outros tipos previstos no Código Penal ou em outras leis, aplicando-se portanto, cumulativamente, as sanções previstas em uns e outros.

Todos os crimes catalogados no CDC são de Ação Pública, cujo titular é o Ministério Público. O procedimento obedece às regras do Código de Processo Penal.

18) A DEFESA DO CONSUMIDOR EM JUÍZO - O principal aspecto da defesa do consumidor em juízo é a facilitação do acesso à justiça, conforme previsto nos incisos VII e VIII do art. 6º, e efetivada através dos arts. 81 a 104.

Pelo art. 83, são admissíveis todas as ações cabíveis e adequadas à tutela dos direitos e interesses dos consumidores. Podem, portanto, ser impetradas ações declaratórias, condenatórias, constitutivas positivas e negativas, de execução, cautelares e mandamentais, inclusive sob a forma de ação civil pública, por força do art. 117 do CDC que introduziu o art. 21 à Lei 7347/85 (LACP), entrelaçando ambos os sistemas (o do CDC e o da Lei da Ação Civil Pública).

19) A DEFESA COLETIVA; INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS - A ação civil pública é o instrumento adequado à defesa coletiva do consumidor. Não cabe aqui analisá-la em profundidade, dado à exigüidade desta abordagem. Tão somente alguns tópicos mais característicos.

Basicamente, a ação civil pública é um procedimento único em prol de muitos, e pode-se revestir das mais variadas formas, embora as mais comuns sejam as que visam ao cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer, ou para obter indenizações por defeito de produto ou de serviço e contra a propaganda enganosa ou abusiva. Atende ao interesse público e alivia o judiciário por evitar a pulverização de demandas. Através dela não se expõem indivíduos, os quais, na condição solitária, seriam passíveis de sofrer represálias e discriminações, e se afasta o risco de decisões contraditórias para casos idênticos. Ao fortalecer o pólo onde se encontram os consumidores, através do tratamento coletivo que enfeixa várias pessoas em torno de um interesse específico e uma só demanda, a ação civil pública possibilita a anteposição da parte vulnerável ao poder mais forte dos fornecedores.

Não é cabível na defesa dos direitos estritamente individuais. Presta-se à defesa dos interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Direitos e interesses difusos são os transindividuais que atingem um número indeterminado ou indeterminável de titulares em torno de um interesse cujo objeto seja indivisível, e ligados por uma relação de fato. Ex.: as vítimas de uma propaganda enganosa ou abusiva.

Direitos e interesses coletivos são os transindividuais, e indivisíveis, que atingem vários consumidores determinados ou determináveis (grupo, categoria ou classe), ligados entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. Ex.: os integrantes de um consórcio.

Direitos e interesses individuais homogêneos são os de pessoas individualizadas, detentoras de direito divisível (ou seja, um direito mensurável individualmente), de origem comum a todos os interessados. Esses direitos e interesses, embora individuais, têm titularidade plúrima, indicando e personalizando os diversos titulares dos interesses e direitos. São individuais porque titularizam, uma a uma, pessoas determinadas. São homogêneos porque, entre essas pessoas existe uma identidade de direitos, o que possibilita a cada titular, ingressar como litisconsorte ativo na ação coletiva (art. 94 do CDC). A uni-los, a origem comum, pelo pedido que se pretenda fazer em juízo, ou seja, que no pólo passivo da responsabilidade, esteja sempre o mesmo demandado que foi parte em todas as relações jurídicas de consumo havidas na raiz. Ex.: várias pessoas lesadas por um tipo de contrato de adesão de um plano ou seguro de saúde.

A ação civil pública produz coisa julgada erga omnes quando trata de interesses difusos, de modo a que a sentença produza resultado uniforme, oponível a todos, em benefício das vítimas do mesmo evento e seus sucessores, tenham ou não participado do processo como litisconsortes. Se a ação for julgada improcedente por insuficiência de provas, nada obsta a que qualquer interessado ingresse com outra versando sobre o mesmo tema, valendo-se de nova prova (art. 103 – I)

Quando se trata de direitos ou interesses individuais homogêneos, a sentença faz coisa julgada erga omnes para beneficiar o consumidor se houver procedência do pedido. Mas, se a decisão for desfavorável em virtude da falta de fundamento para a pretensão ou por insuficiência de provas, isso também não impede que qualquer interessado, isoladamente, proponha uma ação individual sobre o mesmo objeto.

Tratando-se de interesses e direitos coletivos, a sentença tem efeito ultra partes, alcançando quem não tenha sido parte no processo, ou aqueles que, tendo ingressado com ações individuais, desistam desta em trinta dias do conhecimento da exist6encia da ação civil pública que versa sobre o mesmo assunto da ação individual (no caso de interesses individuais homogêneos).

Portanto, não há impedimento para que se intentem ações individuais concomitantemente, ou antes, ou depois, de uma ação civil pública que verse sobre o mesmo objeto (art. 104 do CDC). Não há induzimento de litispendência.

O objeto da ação civil pública pode ser a condenação em dinheiro, obrigação de fazer ou de não fazer, cominação de multa pelo descumprimento da obrigação (a ser recolhida ao Fundo previsto no art. 13 da Lei 7347/85 – LACP), inclusive para efeito de prover uma situação emergencial em concessão de liminar (arts. 11 e 13 da Lei 7347/85 – LACP).

O foro competente para o seu ajuizamento é, em princípio, o do local onde ocorrer o dano (art. 2º da Lei 7347/85 – LACP), ressalvadas as matérias de interesse da União, diante dos quais se transfere a competência para a Justiça Federal. Logo, a cláusula contratual de eleição de foro é, em princípio, questionável, e só vale se isso não prejudicar o consumidor, notadamente no aspecto do acesso à justiça.

A Lei 7347/85 que rege as ações civis públicas, prevê, no art. 4º, a ação cautelar e, no art. 12, a concessão de liminares. Mas não só nas ações cautelares, porque também nos próprios autos da ação principal, em qualquer fase, pode ela ser concedida (§ 3º do art. 84 do CDC), como também pode acontecer a antecipação de tutela. Pode acontecer que os pressupostos para a concessão da liminar não precisem de ser formalmente demonstrados, dado à sua evidência, pelo que o juiz poderá conceder a tutela específica da obrigação ou determinar providências que assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento da obrigação, podendo, para tanto, impor multa, ou outras providências como busca e apreensão, remoção de coisas ou pessoas, desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, inclusive requisitando força policial (§§ 3º, 4º, 5º do art. 84 do CDC).

Por serem de ordem pública e interesse social, os direitos e interesses tutelados pelo Código não são, em princípio, disponíveis, salvo quanto a aspectos complementares referentes ao patrimônio, e, mesmo assim, conforme as alternativas estabelecidas pelo próprio Código, que, embora não avesso a acordos, busca impedir que sejam estes nocivos ao consumidor.

Tratando-se de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, todos os interessados são, ao mesmo tempo, os titulares. Isto repercute na transação, pois esta exige legitimidade para ser exercida, por ser uma qualidade que se ajunta à parte. Assim, a solução encontrada para a questão da legitimidade foi a de considerá-la concorrente e disjuntiva, transferindo-se para outros entes, como o Ministério Público e órgãos da União, Estados e Municípios. Em face disso, esses "entes" podem agir em nome próprio, mas lidando com interesses de terceiros. Logo, carecem de legitimidade para transacionar em nome daqueles, embora a tenham para ajuizar a ação civil pública que atenda aos seus interesses. Daí porque, nas ações civis públicas, a transação não é admitida.

20) LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO DA SENTENÇA - A liquidação e a execução a título coletivo poderão ser feitas pelos legitimados concorrentes no próprio juízo da ação condenatória. O produto da condenação reverte em favor das vítimas, mas se decorrido um ano sem que se tenham habilitado, os legitimados do art. 82 (Ministério Público, associações civis e outros) poderão promover a liquidação e as execução revertendo o produto da condenação para o Fundo de Reconstituição de Bens Lesados (Art. 100 do CDC). Mas a lei dá preferência ao ressarcimento individual, e assim os créditos oriundos de condenação por lesão a interesses difusos ou coletivos, só serão recolhidos ao referido Fundo se o patrimônio do devedor for suficiente para responder pela totalidade da dívida, caso contrário terá preferência o ressarcimento dos danos individuais (art. 99, parágrafo único).

Já a liquidação individual pode ser promovida no juízo da ação condenatória (art. 99, § 2º - I). Podem ser diversos os juízos da ação de conhecimento e o da liquidação e execução, o que beneficia o consumidor, porque uma sentença condenatória exarada em um Estado, poderá ser liquidada em outro Estado, no qual resida o consumidor – autor – liquidante.

A execução, quando a título coletivo, é promovida no mesmo juízo da ação de conhecimento. Se for definitiva, corre nos autos da referida ação, mas, se for provisória, ou seja, antes de a sentença transitar em julgado, corre em autos apartados (art. 98 § 1º do CDC, c/c o art. 587 do Cód. de Processo Civil)

No caso de ação coletiva em que o "ente" Autor não promova a execução da sentença condenatória transitada em julgado no prazo de sessenta dias, terá de fazê-lo o Ministério Público (art. 15 da Lei 7347/85 – LACP).

Quanto aos recursos, a Lei 7347/85, art. 19, remete ao Código de Processo Civil, de modo que valerão as regras desse diploma legal referente ao assunto, subsidiariamente.

Não se admite a intervenção de terceiros, como chamamento ao processo e denunciação à lide, nas questões indenizatórias que envolvam a responsabilidade objetiva do fornecedor (art. 88 do CDC). Isto porque seria retardar o processo, com prejuízos ao consumidor, se se permitisse ao fornecedor apurar a culpa de quem lhe deva indenizar em regresso. A ação regressiva poderá seguir em processo autônomo, ou nos mesmos autos da ação interposta pelo consumidor, mas após resolvida a questão.

21) CONVENÇÃO COLETIVA DE CONSUMO - Na previsão de que os acordos podem beneficiar os consumidores e ao mesmo tempo harmonizar as relações de consumo, o Código prevê, no art. 107, que as entidades representativas de fornecedores e consumidores convencionem quanto ao preço, qualidade, garantia e características dos produtos e serviços, bem como à reclamação e composição dos conflitos. A convenção assim formada, deve ser reduzida a Termo, obrigando todos os signatários, mesmo que, posteriormente algum se desfilie. A convenção obriga a partir do registro em cartório de títulos e documentos. Não poderá, porém, avançar sobre os princípios do Código, como por exemplo negociar sobre a periculosidade de produtos, ou transigir sobre direitos e interesses do consumidor. Isso é vedado, devido ao caráter de ordem pública e de interesse social de que se revestem as normas que tratam do assunto, no corpo do Código de Defesa do Consumidor.

(Obs.: comentários extraídos e adaptados do livro "O Ministério Público e a Cidadania", edição do Instituto do Ministério Público de Pernambuco, 2ª tiragem, setembro de 1994, páginas 12 a 80, da autoria do Procurador de Justiça NELSON SANTIAGO REIS).


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